BITRIBUTAÇÃO – RETENÇÃO DE ISS NO LOCAL DO DOMICÍLIO DO TOMADOR DE SERVIÇOS POR AUSÊNCIA DE CADASTRO DO PRESTADOR DE SERVIÇOS

Exigência de cadastro para prestadores de serviços fora do município de São Paulo (CPOM), sob pena de retenção de ISS é inconstitucional.

Recentemente, em Decisão transitada em julgado em 05 de junho de 2021, o Supremo Tribunal Federal acabou com uma discussão que pairou por muito tempo no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao passo que declarou incompatível com a Constituição Federal a obrigatoriedade de cadastro para prestadores de serviços fora do município de São Paulo, sob pena de retenção de ISS, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.167.509 de origem do Tribunal de Justiça de São Paulo, interposto pelo Sindicato das Empresas de Processamento de Dados e Serviços de Informática do Estado de São Paulo, onde, inclusive, teve sua Repercussão Geral reconhecida e fixada tese no Tema 1.020.

Para melhor ilustrar a causa e efeito da respectiva decisão, de início vale lembrar que a Constituição Federal descreveu minuciosamente a competência tributária da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de forma rigorosa e exaustiva, bem como os seus limites.

No que tange às limitações ao poder de tributar, a Constituição Federal, em seu artigo 150, proibiu a exigência ou aumento de tributo sem lei que o estabeleça, por qualquer ente da federação que seja.

Trata-se do Princípio da Estrita Legalidade, uma decorrência do direito e garantia fundamental previsto no artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, o qual garante que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

Neste sentido, a Constituição Federal atribuiu aos Municípios a competência tributária para instituir o ISS, ou também chamado ISSQN – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza, que esteja definido em Lei Complementar, nos termos do artigo 156, inciso III, tendo como fato gerador os serviços prestados que constam em lista anexa da referida Lei Complementar, não havendo margem para exigência de ISS de forma diversa.

Vale destacar que, em regra, o ISS é devido no local do estabelecimento do prestador de serviços ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, conforme dispõe o artigo 3º, tanto da LC nº 116/2003, ou seja, em regra é devido ao Município onde o prestador de serviços encontra-se estabelecido ou domiciliado.

Com isso, cabe ao Município legislar sobre assuntos de interesse local, suplementar a legislação federal, no que couber, nos termos do artigo 30, da Constituição Federal, de modo que o Município de São Paulo trata sobre o ISS, de sua competência tributária, na Lei Municipal nº 13.701/2003.

Todavia, na legislação municipal de São Paulo foi inserido o artigo 9º-A, pela Lei nº 14.042, de 30 de agosto de 2005, que trouxe a obrigação de inscrição em cadastro da Secretaria Municipal de Finanças, de prestadores de serviços de fora do Município de São Paulo, em determinados serviços (listados no referido artigo), de modo que, na ausência de inscrição no referido cadastro pelo prestador de serviços de fora do Município, a legislação imputou a responsabilidade pelo pagamento do ISS ao tomador de serviços, que deve reter na fonte o valor de ISS, ainda que a competência originária de incidência do ISS não seja do Município de São Paulo, conforme disposto no § 2º, do artigo 9-A, da Lei 13.701/2003.

Com a supramencionada exigência, as empresas filiadas ao Sindicato, que estavam fora do Município de São Paulo e prestavam serviços a tomadores de serviços do município de São Paulo, passaram a ter ISS retido na fonte pelo tomador de serviços, além de recolher o ISS efetivamente devido para o município onde estavam estabelecidos, caso não possuíssem ou promovessem a inscrição em cadastro da Secretaria Municipal de Finanças de São Paulo, denominado Cadastro de Empresas de Fora do Município (CPOM).

No caso em apreço, conforme já explanado, o Município de São Paulo, por meio da Lei nº 13.701/2003, em seu artigo 9-A, passou a exigir, em determinados serviços – cuja incidência do ISS seria no local do domicílio do prestador de serviços –, que o prestador estabelecido fora do Município promovesse inscrição em cadastro junto à Secretaria de Finanças da Prefeitura de São Paulo, sob pena de retenção de ISS.

Ocorre que a imposição do Fisco é nitidamente a hipótese de instituir obrigação acessória – cadastro junto à Secretaria Municipal de Finanças – diversa da obrigação principal, que sequer existe nesta hipótese, o qual impõe a retenção do ISS no Município do tomador de serviços, única e exclusivamente, pela ausência do respectivo cadastro, sem que exista o fato gerador para instituição do respectivo tributo.

Destaque-se que, contrariando a Constituição Federal, o Código Tributário Nacional e a Lei Complementar nº 116/2003, a Lei Municipal nº 13.701/2003, dispôs que, em determinados serviços, na hipótese da contratação de prestador de serviços de fora do Município – onde o ISS será devido ao Município onde o prestador possui estabelecimento – a falta de cadastro do prestador de serviços de outro Município gera a obrigação de recolher o ISS ao Município de São Paulo, cujo imposto deverá ser retido pelo tomador de serviços, além do recolhimento pelo prestador de serviços no Município de seu estabelecimento.

Evidente a violação ao princípio da territorialidade, à normal Federal e Constitucional, ao passo que a legislação Municipal determina o pagamento de ISS por descumprimento de dever acessório que não está vinculado a dever principal de sua competência, o que motivou a impetração de Mandado de Segurança Coletivo pelo Sindicato das Empresas de Processamento de Dados e Serviços de Informática do Estado de São Paulo, distribuído sob o nº 053.05.027.144/2.

Tendo sido denegada a segurança pela 6ª Vara da Fazenda Pública da Capital e negado provimento à Apelação pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, sob o argumento de que a obrigação de cadastramento na Secretaria de Finanças do Município de São Paulo não ofenderia o princípio da territorialidade e a referida legislação não acarretaria a incidência do ISS em dois municípios diversos.

Diante disso, foi interposto o Recurso Extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, distribuído sob o nº 1.167.509/SP, por sorteio ao Relator Ministro Marco Aurélio Mello, que entendeu configurada a ofensa ao artigo 152, da Constituição Federal, pois, ao imputar ao tomador de serviços a retenção do ISS pela ausência de cadastro do prestador de serviços junto a Secretaria de Finanças do Município, o Ente Federativo Municipal está usurpando a competência legislativa alheia, isto é, da União que cabe editar a norma geral sobre a matéria, bem como opera modificação do critério espacial, pois nesta hipótese o ISS seria de competência do Município onde encontra-se estabelecido o prestador de serviços.

Portanto, de acordo com o contexto apresentado acima, onde o ISS é devido no local do estabelecimento/domicílio do prestador de serviços, ou ainda, no local da prestação de serviços quanto este ocorre fora do município de São Paulo, ainda que o tomador de serviços esteja localizado no município de São Paulo, restou considerada indevida a retenção do imposto sob a alegação de ausência de cadastro na Secretaria Municipal de Finanças, visto que reconhecida a inconstitucionalidade do artigo 9-A, da Lei nº 13.701/2003, no julgamento do RE nº 1.167.509/SP, Tema nº 1.020, com repercussão geral, devendo ser aplicado em todos os casos análogos que estavam suspensos até o julgamento do referido tema, bem como aos eventuais casos que surgirem posteriormente.

Assim, com essa decisão, tendo em vista que não houve modulação de efeitos pelo STF, ao rejeitar os Embargos de Declaração apresentados pelo Fisco Municipal, concede a possibilidade dos contribuintes prejudicados solicitarem a restituição de valores pagos indevidamente relativos ao ISS retido dos últimos 5 (cinco) anos.

De igual modo, em que pese a declaração de inconstitucionalidade da referida normal, não é difícil de acreditar que o Fisco Municipal permanecerá exigindo o cumprimento de sua norma, bem como de suas penalidades, podendo ocorrer autuação da empresa tomadora estabelecida em São Paulo pela não retenção de ISS na fonte, a qual, diga-se, poderá ser contestada administrativa e/ou judicialmente de acordo com o entendimento acima exposto.

Obs. 1 – Cada caso concreto deverá ser analisado por um especialista que verificará a possibilidade de proceder com as medidas cabíveis no sentido de evitar o pagamento do valor excessivo ou de restituição do valor indevidamente pago. Obs. 2 – Em conformidade com a regra contida no artigo 168, inciso I, do Código Tributário Nacional, o prazo para extinção do direito de pleitear a restituição de tributo indevidamente pago pelo contribuinte é de 5 (cinco) anos, a contar da data do respectivo pagamento.

Referências:

Constituição Federal – http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

Lei Complementar nº 116/2003 – http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp116.htm

Lei Municipal nº 13.701/2003 – http://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-13701-de-24-de-dezembro-de-2003

Lei Municipal nº 14.042/2005 – https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/arquivos/secretarias/financas/legislacao/Lei-14042-2005.pdf STF. RE nº 1.167.509/SP. Tema nº 1.020 repercussão geral, Plenário. Rel. Ministro Marco Aurélio. Julgamento: 01/03/2021. Trânsito em Julgado: 05/06/2021. http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5563078

Esperamos que tenha gostado do nosso artigo.

Caso tenha ficado com alguma dúvida ou deseje nos fazer uma consulta, envie-nos os seus dados que um de nossos especialistas entrará em contato.

      Fique em contato


      os termos de uso e receber comunicações da Estelles Advogados.

      Rua da Consolação, 348 - 15º andar
      Telefone (11) 3256.4999 • Fax: (11) 3231.1878
      contato@estellesadv.com.br


        Envie seu currículo